duas cerveja, dois cigarro e um pote de mel no fim do arco-íris
Hoje conheci um velho foda. Uma criança de setenta anos chamada Flávio Tavares. Um dos remanescentes de uma geração que ainda teve alguma moral pra chamar a nossa de caga-bostas, a geração de meu avô, cuja única falha foi gerar uma cria maldita como a geração de meus pais.
Isso me dá a esperança de que eu comece a escrever decentemente quando tiver meus setenta...
Embora ele tivesse o direito de achincalhar minha geração, não o fez. Na verdade ele acabou lembrando dos próprios membros da geração dele, dos amigos de infância que desistiram de ler seu livro ao abrir no primeiro capítulo e encontrar a narração de uma seção de tortura com choque no saco. Isso dói só de imaginar, dá pra entender o desânimo dos vovôs ao ler tal coisa.
Meu avô costumava vir aqui em casa virar steinhager com meus amigos. Bando de filhos da puta os que nasceram nos anos 20 e 30. Apenas um amigo meu conseguia acompanhá-lo, mas acho que de alguma forma isso estava relacionado ao fato de ele ter se formado em naturismo. Toda aquela viadagem de andar pelado pra cá e pra lá lhe dava algum ânimo.
Mas eu nunca fui torturado com choque nos sacos, e sou grato a isso. Todas as namoradas que me sugeriram isso na adolescência como brincadeira sensual já se foram, e eu resisti bravamente. O mais perto que cheguei disso foi ser mordido na virilha, às seis da manhã, por um cara que achava que tinha virado vampiro. Mas isso já está viado demais e é melhor parar por aqui. Na virilha eu disse, ênfase nisso, nem no saco nem ali por perto. Bem, foi mais pra perto da coxa, na verdade, quase no joelho.
Depois fui comprar carne na promoção. A promoção acabara. Fui comprar uma estante na promoção. As estantes acabaram. Eu era um fracasso. Tinha meu nome lá no verbete do dicionário. Senti saudades do tempo do racionamento, em que eu acordava de manhã pra ir com meus pais comprar leite pois era limitado a dois litros por pessoa. Chegava atrasado na aula, esse era o maior prêmio.
Um leitor me mandou um conto seu. Um elevador lotado, alguém peidava e um índio, em pânico, arrombava a porta e fugia. Bom roteiro, bom saber que alguém se preocupa com o resgate dos valores das comunidades indígenas.
Outro leitor me mandou uma carta ameaçadora. Se eu não parasse de divagar e voltasse a escrever coisas com sentido ele me mandava uma carta bomba.
Isso tudo eram detalhes que absorviam meus pensamentos quando cheguei em casa e peguei minhas duas cervejas na geladeira. Despejei na jarra de leite e tomei tudo como se ali estivesse a salvação.
Nada.
Fumei um cigarro. Dois. Três, mas para efeitos literários resolvi que omitiria o terceiro.
Ainda assim, nada.
Meditei sobre a salvação do universo.
Nada. De novo.
Eu era um fracasso. Deitei pelado no escuro tentando dormir e ouvi aquele barulho característico de bater de asas. Lá estava. Parada ao meu lado, mantendo-se no ar apenas pelo lento bater de suas asas, a grande vulva colossal. Brilhando em púrpura. Sedenta pelo meu corpo e minha mente. Sedenta de calar minha busca por respostas.
Fiquei ali parado, como sempre, assistindo aquele espetáculo grandioso que embalava meus sonhos mais belos. Os lábios se abriram mais e mais e o grande jorro do fluído vaginal começou. Escorria pro chão e espirrava esguichos nas paredes e no teto. Um arco-íris se formou quando uma réstia de luz que passava pela cortina cortou os vapores vaginais em suspensão.
Eu estava quase dormindo e deixei que meu corpo levitasse por aquele arco-íris rumo ao prazer. Um grande pote de mel dourado escorria e ali lembrei que a felicidade era possível.
Mais um dia de trabalho concluído.
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