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Frio é uma porra

Frio. Tão frio que um cara mal podia achar seu teco na hora de mijar. Muito frio. E Clarissa me deixara, pra piorar toda a situação. Logo retornaram as longas sessões de masturbação, mas o frio era tanto que geralmente eu parava a coisa no meio e ia dormir assim mesmo, antes que o frio me brochasse.

Bem, não culpo Clarissa por ter me deixado, já tinha meses que a coisa toda tinha se transformado numa bosta. Mas o pior foi que, em menos de um mês, aparece esse cara do nada e logo já estão casando.

Clarissa fazia supletivo, e, em meio às provas finais e festas da turma, fazia o vestido, organizava a festa, preparava convites, tudo isso para casar com aquele fulano chamado sei lá o quê. Eu precisava esquecer. Precisava esquecer Clarissa e precisava de mulher, e uma coisa não excluía a outra. Precisava de comida e dinheiro também, uma vez que era Clarissa quem me sustentava.

Arranjei um emprego. Um bico, na verdade. Passei lá no primeiro dia e o cara disse que era só resumir uns textos pra mandar pra imprensa, que ainda não sabia quanto eu ia ganhar mas, enquanto isso, já deveria ir trabalhando. Eu sentia uma roubada quando me aproximava de uma, mas mesmo assim resolvi insistir nisso.

Passei a acordar de manhã e ir pro trampo, e isso era bom, era sempre de manhã que ela ligava pra me aporrinhar. Acordava seis e meia. O céu era preto e o ar congelado, duro como pedra. Na cama os três cobertores debochavam da minha cara, deixando passar pelos grossos furos o ar gélido. Quando ventava minhas cortinas balançavam e eu vivia dizendo que iria um dia mandar refazer a vedação das janelas. Isso quando tivesse dinheiro, é claro, coisa que eu não via há anos.

No caminho pro centro, nas curvas rápidas e brecadas violentas do ônibus, minha ressaca começava a passar. Uma parada prum café antes de começar o trabalho, depois trabalhar meia hora, depois sair, aproveitar o sol das nove horas que já começava a esquentar um pouco, procurar por menininhas nos colégios e nas lojas do centro, secar os peitos da mesma balconista gorda de sempre e depois, às onze e meia, voltar, guardar as coisas e ir embora. Trabalhar até que não era tão ruim assim.

Depois de uma semana, Clarissa desistiu de me ligar de manhã e descobriu que eu andava ficando em casa a noite. Era sempre o mesmo blábláblá.

--- Alô?

--- Alô? Oi?

--- Oi, Clarissa ...

--- Ah, Anaca, é tu... nossa, preciso da tua ajuda... meu vestido blábláblá... o salão bláblábláblá... e... ah, pena que a gente não deu certo, né? Mas tô tão empolgada blá bláblá blá blá blá.

Uma vez Clarrisa saíra de noite comigo. Era super-ciumenta, e queria ter certeza de que eu não andava agarrando menininhas quando saía a noite sem ela. Fomos na lagoa, no bar de um conhecido onde eu agarrava menininhas quando saía a noite sem ela. Ficou lá, sentada na mesa, com cara de emburrada, sendo ignorada por todos os outros, que não gostavam nenhum pouco quando um cara levava a namorada lá. Podia dar sujeira, podiam as outras namoradas também quererem freqüentar o bar, e todos sabem que não se caga no mesmo lugar que se come, isto é, não se leva a mulher que come pro lugar onde se faz as cagadas.

Mas Clarissa, se não me amava, pelo menos confiava em mim, de forma que acabou deixando de lado essa tolice de suspeitar de mim e parou de ir ao bar.

Agora era isso, seis meses depois e eu estava num banheiro, com três graus centígrados, sozinho, num emprego de merda, com azulejos mal colados despencando da parede, agüentando essa alugação de casamento e pena-que-não-demos-certo, tentando desesperadamente transformar uma excitação com peito na tevê em um pouco de prazer, em algo que fosse ao menos limpo e honesto. Mas com tudo isso na cabeça, não há quem possa ter, de fato, um orgasmo honesto. Assim eu parava na metade e já era o suficiente.

Um dia cheguei lá, no suposto emprego, e tava um corre-corre desgraçado. O cara se metera com algum dos desvios de verbas do governo e a coisa toda fora descoberta. Fui até lá, inventei uma desculpa, morte da mãe eu acho, pedi um adiantamento da grana e caí fora, nunca mais voltei lá.

Ao menos tinha algum puto no bolso agora e passaria uma semana indo no mesmo bar, consumindo uísque e charuto. Naquela noite resolvi ir até o fim e me masturbei até chegar às vias de fato e melecar todo o chão do banheiro.

Acendi um charuto. Fui até a cozinha e voltei com um generoso copo do vinho de garrafão que eu comprara. O telefone tocou. Eram nove da noite. Tirei o fone do gancho e berrei: "Vá a merda, sua puta vadia, antes que eu esfole tua boceta e pregue num muro!!!".

Ouvi um gritinho do outro lado, de medo e nojo, antes que desligassem. Era Clarissa. Sentei no sofá dando uma bela tragada no charuto de 1 pila e ela nunca mais me ligou.


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