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Impropérios comedidos

Nuvens vazias voltavam novamente a pairar sobre meus dias como, falsa felicidade e, amargura ao som de Mahler. Fora chutado pela mulher e por causa disso punha vírgu-las e ífens nos lugares errados, e errava na ortografia como ela sempre costumara fazer.

Não ela não era idiota, como eu costumava ser. Apenas eu que era sentimental demais e ficava deprimido à toa. Costumava chorar quando trepávamos, o que me fazia chorar também. Ficávamos os dois chorando, sem um saber o porquê do outro chorar, enquanto sentíamos lentamente o movimento autômato de nossos pau e buceta.

Era terno, não posso negar. Ela tinha metade da minha idade e eu me perguntava às vezes se não seria preso por estar fazendo isso. Depois da aula ela saía do colégio e vinha me ver, com seu sorrisinho infantil que me lembrava a filha que nunca tive, a filha que foi morta ainda no ventre à mando da mãe.

A primeira vez que trepamos fiquei deitado, imóvel, tentando de alguma forma controlar ela que, desajeitada, pulava como uma louca em cima de mim, machucando. Ela já tinha feito isso várias vezes com outros caras, mas sempre mal feito. Só tivera homens sacanas e idiotas que lhe davam fodas sem gosto algum, e eu precisei ensiná-la. Nessa primeira vez foi como se tivessem coberto meu pau e coxas com carne moída crua e soltado um bando de ratazanas famintas em cima. Ela era ainda um bicho selvagem, mas eu estava saindo de um relacionamento difícil com uma mulher dez anos mais velha, de forma que me animava o fato de pegar uma menina ainda tão despreparada, tão sem a carga de traumas que as mulheres geralmente carregavam. Eu mesmo demorei anos depois de começar a fuder até o dia em que uma bela moça, jovem e mulata, me deu uma surra de buceta uma noite inteira e me mudou totalmente a concepção do que era transar.

Minhas mulheres foram sempre estranhas e recatadas. Uma não conseguia gozar sem fazer meia hora de sexo anal e se horrorizava com uma outra que não conseguia gozar se não estivesse transando num local público que se horrorizava com outra que não conseguia gozar se uma amiga sua não estivesse transando junto que se horrorizavam com essa outra que só conseguia gozar depois que eu a chamasse de filhinha e ela começasse a chorar que se horrorizava com todas as outras.

E eu apenas as queria fazer feliz. O que conseguia, até que novamente as nuvens surgissem no meu horizonte e me tornassem melancólico e rancoroso e triste e... e me fizessem parar de dar o valor que elas tinham que eram pra mim mais importante que ar ou ouro e que me faziam achar que valia a pena viver.

Mas todas elas eram sempre inseguras e não viam que eu era inseguro e que eu precisava delas tanto ou mais do que elas precisavam de mim. E toda vez que uma mulher dizia que me amava era porque eu perguntava e eu vivia repetindo a elas que as amava e amava intensamente todas elas.

Antes de me deixar ela justificou: eu não era sensível o suficiente. Não bastava que eu a amasse, não bastava que eu chorasse escondido em casa, ou procurasse de madrugada a casa de amigos que não via há anos, ou incomodasse regularmente meus amigos mais próximos falando dela a noite inteira e terminando chorando às oito da manhã na beira de uma rodovia enquanto eles sonolentos esperavam o fim de meu monólogo para irem para suas casas, comerem suas mulheres e dormirem com suas felicidades.

Eu estava à beira de um novo século, milênio e tudo mais, mas não via perspectiva alguma pro mundo. Eu mudara toda minha vida para se adequar à mulher, para dar espaço à ela, para que ela pudesse entrar e expulsar tudo aquilo que antes ocupava meu tempo, para que pudesse amá-la sempre. Mas sempre não existe, e ela se foi, e levou junto o espaço que antes era preenchido e, no fim, ainda me culpou por não saber mantê-la, por não ir atrás dela e obrigá-la a estar sempre junto de mim, por não prendê-la. Todos os fins foram sempre assim, fui culpado por libertar aquilo que amava, e ainda mato um dia o idiota que me ensinou a amar essa merda chamada liberdade, para qual as pessoas não estão nunca prontas.


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