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A tarada e eu

Há muito tempo já que venho regularmente mencionando uma figura folclórica do cotidiano Giqiano, a atendente tarada. Às vezes as pessoas me param em plena lagoa ou na praça quinze, dando esporro:

--- Porra Anacreonte! Que merda é essa de atendente tarada! Porra tu é um puto mesmo, vai a merda!

--- .......

Como meu público costuma a me pedir sempre com tanta gentileza resolvi explicar. Explicar e tornar público, tudo de uma vez só, para evitar futuras interrupções nos meus porres.

Primeiro vou começar explicando o que é o Giq. O Giq é um grupo secreto milenar, que tem vivido oculto da humanidade, coordenando e controlando os principais fatos históricos para impedir que a mesma se destrua... foi só a gente descuidar por cinco minutos que fizeram uma segunda guerra mundial... (na primeira foi porque estávamos todos de ressaca e não queríamos nos meter naquilo...)

Pois bem. O Giq é isso e pronto. Antes do Giq não existia nada. Estudamos desde o início da humanidade tentando compreendê-la e dominá-la, de forma que hoje em dia detemos praticamente todo o conhecimento do mundo. Apenas um fato permanece ainda um mistério para o Giq, que vou contar daqui a pouco quando começar realmente a narrar a história.

Um dia, num domingo chuvoso, à noite, resolvi que precisava comer alguma coisa. A atendente tarada foi a primeira coisa que me passou na cabeça. Não... na verdade não foi a primeira coisa, mas como eu não queria chorar de tristeza e ter um ataque cardíaco pensando naquela que era objeto doentio de minha paixão, escolhi a atendente tarada mesmo. Além do mais, amanhã era segunda e, pra variar, eu precisava desesperadamente preparar o seminário que estaria apresentando de manhã, o que fazia com que eu deixasse a porra do seminário de lado e me dedicasse ainda mais desesperadamente a escrever um conto... de preferência um conto onde bucetões voassem pelas ruas e invadissem minha sala, devorando-me.

Já falei que minha gata é vazia por dentro? É, é sério, abriram a coitada e tiraram tudo de dentro, ovários, útero, trompas, tudo, tudo, tudo. Até as tripas se bobear, pois nunca vi um animal de meio quilo conseguir cagar tanto. Eu sei, eu sei, tô mudando de assunto de novo, mas é mais forte que eu, não posso evitar. Disseram que isso era pra coitada não engravidar e eu fico até hoje me perguntando: como sabiam que eu fazia isso com a coitada?

Mas vamos ao ponto. O fato é que o Giq buscava sua pedra filosofal. Buscava o único conhecimento que, de uma vez por todas, se revelaria ao Giq, abrindo ao mesmo as portas da compreensão sobre a espécie humana. Aqueles eram tempos loucos, e acreditávamos realmente na possibilidade e na eminência da descoberta daquilo que era o segredo mor que ha tanto tempo nos desafiava: Afinal, como funcionam as mulheres e seus desejos?

Tentávamos sem sucesso há séculos, mas acreditávamos estarmos cada vez mais perto, principalmente quando começamos a aplicar em nossas pesquisas os princípios da teoria do caos, da lógica para-consistente e do irracionalismo nietzscheniano.

Com os ensinamentos esotéricos de Dom Alephito, a ciência e o neo-positivismo de Dom Véritas, e o niilismo fleumático e persistente de Dom Vidalito, montei a mais absurda e poderosa configuração de poder possível à Qabala Giqiana, numa tentativa desesperada de comer alguém. Isso ocorrera numa sexta-feira. E todos os fatos que daí se sucederam e se desdobraram freneticamente, numa dança insana de destinos e tragédias, me levavam a crer em uma única e definitiva explicação. Eu conseguira. Eu obtivera finalmente aquele que era o sonho ancestral e primitivo que desafiara o Giq desde o início dos tempos, eu achara a Vulva Filosofal.

Assim, tão logo percebera isso, larguei meu conto e saí apressado, decidido a comer a infalível atendente tarada.

Fumei um cigarro. Entrei no bar. Sentei. Fumei mais um cigarro e fiquei secando as pernas daquela que seria minha vítima. Pedi uma cerveja. Bebi. O mundo parecia melhor e eu me sentia investido pelos poderes a mim confiados de governar o mundo. Chamei a atendente tarada. Ela veio roçando suas coxas perfeitas uma na outra. Parou ao meu lado sorrindo sacana e perguntou com seus lábios quase pulando em mim: Mais alguma coisa? A atendente, respondi. Pois aproveita que ela já tá aqui, pode fazer o que quiser. Vou levar pra casa, então, eu disse e já fui logo deslizando minhas mãos naquelas coxas e buceta perfeitas. Calma amor, eu só posso sair depois das dez. Isso não te impede de passar lá em casa. Hmmm, gostei disso, só que eu tenho um filho, não vai dar. Não precisa levar o moleque. Dei-lhe um beijo na boca, um guardanapo com meu endereço e o dinheiro da cerveja (exato, pois a gorjeta era muito extorsiva). Fui embora.

Cheguei em casa ansioso. Estava no papo. Eu finalmente compreendera as mulheres. Estava feito agora. Em meia hora estaria fudendo aquelas carnes generosas que por tanto tempo ela oferecera.

Masturbei-me três vezes enquanto esperava, pensando naquela mulher de seus trinta anos, ainda enxutona, tão deliciosa que parecia ser, às vezes, uma simples adolescente invés da mulher fodedora que era.

A campainha tocou. Botei uma cueca e meu roupão por cima e fui atender. Abri. Um adolescente barbado avançou contra mim. Seu fillho da puta, quis comer a minha mãe! Vou te ensinar a não fuder com a mãe dos outros.

O guri, que devia ter seus quinze anos, tirou uma barra de ferro e começou a fazer sua pequena obra de arte no meu rosto. Eu, já bêbado, procurava no início me defender, até que uma idéia suave e branda pareceu acalmar de repente meu corpo e cérebro, uma sensação de distanciamento e superioridade, uma sensação divina de inexistência e aniquilação do ser. Eu falhara com o Giq. Falhara com a Qabala. E de alguma forma o sonho de descobrir a Vulva Filosofal parecia agora cada vez mais longe. A barra de ferro acertava minha cara, fazendo barulhinhos engraçados ao quebrar os ossos. Vusch, um olho explodia em sangue numa pancada certeira. Cloc, e a mandíbula partia-se em dois. Por fim o sangue cobriu meu rosto e senti a sensação de levitar.

E foi então que o moleque se cansou da brincadeira. Parou cansado, de tanto bater num bêbado de cuecas, em plena porta da casa, à beira da rua, e disse ofegante:

--- Morreeee.... uff... ufff... mal...ff...ufff... maldito. Ffff... fff... ff... morre... filho... da... fff... puta!

Naquele momento eu soube. Ouvi aquela música estranha que invadia a pacata Trindade e percebi: eu não iria morrer. Eu não podia morrer. Giqianos são imortais até que se tenha escolhido um sucessor para ele no Giq. Eu iria viver por enquanto e poderia continuar a perseguir meu sonho, a Buceta Filosofal. O garoto deu-me por morto, virou as costas e foi embora. Eu estava vivo. Eu estava vivo! O Giq vencera novamente!


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