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Uma noite de trabalho duro

Fumava e bebia como um condenado. Estava no meio do meu primeiro romance e escrevia o dia inteiro como se estivesse possuído. A pressão era exaustiva. O esforço, extenuante. Mas não era sem motivo, afinal este era meu primeiro romance, ou melhor, seria, se eu não o tivesse jogado no lixo assim que ele terminara. Era muito ruim... invés de "Mergulhando no ar" devia tê-lo chamado de mergulhando no lixo... que foi o que realmente aconteceu.

Mas, apesar disso, lá estava eu. Nada importava, nada mais me interessava, eram só as teclas e eu. O brilho da tela e a música da impressora eram minhas diversões.

E foi numa destas noites que, lá pelas três da madrugada, toca a campainha. Era isso que eu sempre gostei naquela casa... como a casa de Bukowski sempre aparecia, no meio da noite, uma mulher bêbada procurando por mim, o maior escritor vivo do mundo.

Era a Kike. Kike Osuas, irmã do Aleph e estava completamente etílica, pra variar. O que não surpreendia, afinal eu nunca vira ela sóbria um único dia sequer. Veio me falando um cem milhão de coisas e eu disse, Calma aí Kike...deixa eu só acabar o que eu tô escrevendo e já falo contigo. Era mentira, é claro, e ambos sabíamos disso...

Posso chamar uma amiga? Claro, respondi.

- Alô... Kaciane... oi, tudo bem... é... ahan... isso... ai, jura?... legal, feliz aniversário... ahan, é... tô aqui na casa do anacreonte, cês querem vir aqui? - Anaca posso chamar umas amigas? - ...ahan ... tá... tô esperando então.

Kike desligou e começou a falar sobre um monte de coisas, eu escrevia, eu fumava, eu bebia. Depois de uma meia hora, tocou a campainha. Ela atendeu e voltou com mais umas três amigas do curso de modelo dela. Elas me abraçaram, me beijaram, disseram seus nomes. Eu disse oi.

Foram pra sala e começaram a beber a bebida da minha geladeira, afinal era só isso que tinha nela. Eu escrevia, suava, bebia, fumava e me limitava e dar um sorriso breve quando uma delas vinha me trazer mais bebida. Anaca, posso ligar pruma amiga? Claro Kike.

Logo chegaram mais quatro gurias. Depois mais três. Uma Kombe hippie parou e mais seis, todas loiras, desceram. Loiras artificiais, é claro.

A casa, que não era muito grande estava lotada. E quente, quente como o inferno. Eu suava e escrevia, tentando ignorar a música alta que tocava. Mais quatro chegaram e casa ficou mais ainda lotada e quente. No quarto onde eu escrevia uma multidão de mulheres se acotovelava e me espremia enquanto eu, concentrado, escrevia meu romance sobre um cara que nunca arranjava mulher.

O calor era muito. A bebida era muito. Todas doidas, bêbadas, se escorando, até que uma teve a idéia e tirou a camisa. Outra se empolgou com aquilo e foi logo tirando quase toda a roupa, até ficar só de calcinha e sutiã. Logo um batalhão de mulheres nuas e bêbadas corria pela casa e eu tentava desesperadamente criar a cena na qual o protagonista era salvo da morte por um cão salva-vidas... não, minto, na verdade eu tentava criar uma cena na qual o protagonista tentava insanamente comer alguém mas, pra variar, por muito pouco não conseguia.

De súbito um ímpeto de animosidade invadiu a festa e todas viram me abraçar e agradecer a hospitalidade. Continuei escrevendo.

Já era tarde quando começou tudo a esvaziar. Estava cansado, nas últimas mesmo. Nunca escrevera tantas páginas de uma só vez. Fui dormir. Na cama me meti no meio das quatro que lá estavam e disse que ficassem a vontade, que não se incomodassem comigo e continuassem fazendo o que tinham ido ali fazer. Continuaram. Não tardou e eu já estava dormindo, afinal, amanhã seria um dia importante, amanhã eu chegaria, finalmente, na metade do suado romance.


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