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A lei é foda mas é lei

-Que Comece a sessão! - ordenou a juíza.

Sessão! Aquilo não era porra nenhuma de sessão, era um purgatório, um julgamento, MEU julgamento.

- O réu se declara inocente - assertei.

- Caleaboca, senhor Wers, em minha corte o senhor só se manifesta quando for solicitado! E o senhor não é réu de nada por enquanto, isto não é um julgamento, é meramente um caso de pensão familiar!

Senti o cotovelo de meu advogado, bem, meu parceiro de copo das sextas à noite na verdade, se afundando em meu fígado... como se ele já não estivesse o suficientemente judiado, e resolvi que por ora era melhor eu ficar quieto. Olhei Patrícia lá do outro lado... safadinha, estava mais gostosa do que nunca... olhava pra mim com um sorriso triunfante, me jogando na cara de antemão que era ela quem ia levar a melhor. Eu ainda ia comê-la de novo... talvez no banheiro do fórum, se tivesse intervalo a sessão!

- Sua ex-mulher senhor Wers, está lhe processando pois o senhor não tem pago a pensão para ela e seu filho, o que o senhor tem a declarar?

Eu tenho um filho? Ia eu perguntar estupefato, quando meu parceiro adiantou-se a fazer minha defesa:

- Excelentíssima juíza, a atual conjuntura de desemprego e...

Blá, blá, blá... era sempre a mesma coisa, como se fosse um filme, com a diferença que ali era real... e ainda mais chato. O que eu não daria por um copo de uísque agora. Olhei a juíza. Ela olhava pro Paçoca (meu advogado) com um olhar arguto e perspicaz, uma ave de rapina. Devia ter cerca de quarenta anos... mas tava enxutona. Safada, gostosa. Não usava nenhuma aliança, será que ela topava uma bebida? Fiquei ali imaginando como seria ela sem roupa.

- ... e a criança Alex, cujo amor de meu cliente é, de fato, incontestável, blá blá blá blá ...

Alex! Isso. Meu filho. Era verdade. Eu lembrava agora, um moleque, garoto pequeno, devia ter uns seis meses de idade... era realmente uma gracinha. Ao lado de Patrícia um garoto com uns cinco anos de idade me olhava com uma cara de bobo e uns olhão arregalado. Devia ser filho da advogada dela, ou da juíza, sei lá, que diferença faz?

- ... assim, não tendo emprego nem recebendo nenhuma forma de renda fixa qualquer, meu cliente está portanto isento de quaisquer que sejam suas obrigações quanto a pensão por ele devida.

- Isso é verdade, senhor Wers?

- Posso falar?

- Pode!

- Tá! É... é isso aí eu acho.

- E o senhor não vê nenhuma perspectiva de emprego?

- Posso falar à vontade?

- Claro.

- Tá bom. O negócio é o seguinte, nunca acreditei muito nesse lance de emprego. Vivi sempre um pouco aqui um pouco lá, embora ocasionalmente tenha tido alguns, principalmente na época que Patrícia me obrigou. Mas hoje tô desempregado e sem um puto no bolso, vivendo às custas de amigos, geralmente bêbado até. Um mês na casa de cada e assim a gente vai tocando. Eu sei que a lei me manda dar metade do meu salário pra eles, mas a verdade é que não vejo dinheiro a um tempão, moça. Assim, como eu acho que seria não só ilegal como imoral forçar qualquer homem a trabalhar, eu temo que a lei nada possa fazer nesse caso.

Era isso, eu tinha dito. Tinha arrasado com eles com certeza, eu era o máximo. Olhei para a cara da juíza e ela parecia louca de raiva, mas por um estranho motivo a advogada Dela parecia toda contente, enquanto Paçoca, cabisbaixo, limitou-se a pôr as mãos no rosto.

- Senhor Wers! Além do linguajar impróprio e deu seus modos repulsivos, ...

O senhor fede, ela deveria dizer.

- ... o senhor ainda insulta o tribunal com o uso de termos impróprios numa sala da lei. Em todos meus anos na vara familiar nunca vi um ser tão doente e repulsivo, mesquinho, como o senhor, sentar-se num julgamento. Ainda por cima consta nos autos do processo que o senhor nunca foi capaz de proporcionar a ela prazer, senhor Wers! O senhor está ciente disso, de que ela nunca gozou com você?

Aquela vadia! Olhei pra ela e ela rebateu meu olhar com um sorriso de vitória. Como ela podia, como ela ousava dizer uma coisa dessas, depois de tantas noites que eu a fizera gemer e urrar em meu ouvido? Vadia, mas que golpe mais baixo!

- Senhora juíza, com todo respeito, mas isso é uma puta mentira! Mesmo depois de tanto porre eu consigo até lembrar de todas as vezes que ela gozou e disse me amar!

- Senhor Wers! Consta também, aqui nas declarações, que o senhor é mitomaníaco, egocêntrico e esquizofrênico! O que o senhor tem a dizer?

Era isso. Olhei a juíza, Patrícia e a advogada. Estavam todas com um sorriso na cara, um sorriso de satisfação. Estavam juntas nisso, dava pra sentir. Estavam todas tramando contra mim.

- Mas ... mas... eu sou inocente...

- Senhor Wers, não tente me enganar, por favor! É visível pra mim e pra todos aqui presentes que o senhor é um tipo de homem que seria incapaz de dar prazer a qualquer mulher!

Eu sabia. Desde o início eu sabia que aquilo tudo não passava de um julgamento, um palco montado para me sacanear. De que adiantaria me defender? Preferi ignorar as acusações.

- Senhora juíza, que eu saiba não existe lei nenhum no mundo obrigando um homem a dar prazer a uma mulher. Assim sendo, não tem absolutamente nenhum sentido julgarmos aqui minha vida pessoal. Se ela não gozou o problema é dela!

- Ahá! Eu sabia senhor Wers. Não precisa dizer mais nada, seu ato machista me enoja. Teje preso!

- Mas o que eu fiz? Isso é um absurdo! Estão violando meus direitos!

- Machismo é crime sério, senhor Wers! Ainda mais quando o réu é incapaz de dar prazer à sua mulher! Eu o condeno a dez anos de cadeia, além de uma pena de reparação por danos sexuais à sua mulher de lambê-la aqui e agora, perante as testemunhas aqui presentes, até que ela chegue a um orgasmo.

- Mas ... mas... mas...

Paçoca apenas bateu em meu ombro, sussurrando desculpa. Olhei desnorteado... o que fazer?

- Mas senhora juíza isso é um absurdo. Não vou lamber pomba nenhuma na frente de todos aqui presentes, ainda mais com esse moleque olhudo me espiando.

- A pena já foi determinado senhor Wers, por favor submeta-se aos rigores da lei!

- Mas juíza, minha mãe está aqui na corte, sentada assistindo a sessão!

- Ahá! Vocês homens sempre recorrem a sua mamãe quando estão em apuros, não! Mas não vai adiantar senhor Wers! Desta vez o senhor foi pego pela lei! Desculpas freudianas irão nunca adiantar!

Olhei minha mãe fazendo tricô e o garoto olhudo, parecendo tão perdido quanto eu. Quem sabe eu não era ele e ele era eu? Patrícia estava já despida de pernas apertas a me esperar, suspensa no ar por quatro guardas. Arrastaram-me à força. E foi assim, caros leitores, que fui pego pela lei.


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