Retorna ao início
----->contos do fonjic<-----
2005
2004
2003
2002
2001
2000
1999
1998

E foi então que um dia casei

E foi então que um dia casei...

Bela esposa, belo carro, respeito dos vizinhos, tudo que eu sempre odiara. Mas é volúvel a alma humana e, de repente, tudo isso vinha agora me afagar a barbar cansada e massagear minhas costas como uma prostituta em meio à guerra.

Tudo era rosas e, como não podia deixar de ser, eu tinha uma amante, é claro. Bem me lembro quando ela, Sarah, a amante, dizia:

--- Vem! Quero ver teu pau chorar em mim!

Eu ia, é claro. Deixava as lágrimas preencherem-na e após isso a largava dormindo e ia pra casa, rever meu grande amor.

--- Oi Keline, meu bem! Cheguei!

--- Veio cedo hoje amor!

--- Pois é... o pessoal do serviço resolveu me dar um descanso e saí mais cedo, não são nem dez ainda...

--- Adivinha o que fiz hoje?

Ela sempre perguntava toda empolgada alguma inutilidade, esticando-se pra mim esperando um beijo. Depois de beijar eu respondia.

--- Uau, você pintou a unha que máximo!

--- Ficou bom?

--- Demais! Você fica cada dia mais encantadora.

Aí ela se derretia e ficava um tempão me beijando. Depois eu sentava no sofá e ela ia até a cozinha preparar um uísque pra mim. Voltava com o copo quase cheio, sem gelo, e a garrafa. Ficávamos horas sentados, abraçados, conversando sobre moda, etiqueta e os vestidos que ela quase comprara. Eu nunca reclamava, afinal ela é quem pagava todas as contas.

Por fim, quando eu já estava suficientemente bêbado íamos dormir. Vez ou outra ela me sondava, querendo saber algo sobre meu serviço, o que eu fazia, onde era. Eu sempre conseguia despistá-la. Dava a entender que era algo que tinha a ver com livros, o que afinal, não era tão mentira assim.

Porém, como todo jovem executivo, eu tinha também minhas viagens de negócios. Beijava emocionado minha esposa, quase vertendo lágrimas por ter que partir assim tão depressa por causa de algo de última hora que apareceu. Pegava duzentos pila e ficava uma semana trancado num inferninho na parte mais pobre da cidade, bêbado o dia inteiro, trancado entre quatro paredes, pedindo bebida e garotas por telefone. Nem sempre vinha algo decente como a propaganda dizia, mas fora isso era tudo perfeito.

Ao fim da semana eu voltava pra casa, cansado, e beijava contente Keline, que preparava um banho quente onde eu podia relaxar. Depois me massageava e acariciava até que eu dormisse.

É a vida era boa até, não tinha do que me queixar. Quando passava de carro pelos becos e via aqueles pobres imundos que viviam se esgueirando na escuridão, maltrapilhos e com fome, sempre a se queixar da vida, não podia deixar de parar pra pensar e me perguntar como podia acontecer que tanta gente gostasse tanto de estar sempre se lamentando da vida e de seus problemas. O que tinha de errado com eles, não sabiam que a vida era fácil, bastava simplesmente viver.

Pisava fundo no acelerador e pensava na cerveja que logo iria beber, fazendo com que rapidamente sumissem da minha cabeça e de meus pensamentos todas essas idéias. Eu tinha mais coisa a pensar. Tinha minha cerveja, além da mulher e da amante. É... viver era simples e fácil como um amanhecer. E foi então que me separei...


----------x----------

Para ler mais deste autor visite também:
http://uretrite.blogspot.com/
http://br.groups.yahoo.com/group/fonjic/

Clique aqui para cadastrar-se e receber contos de fonjic por email
Receba contos de Fonjic por email

Consulte
Spectro Editora
para ler sobre Charles Bukowski